Alceu Ruppenthal Meinen, Superintendente de CX e IA na SICREDI

“O Vale do Silício que eu vi”, por Alceu Meinen, Superintendente de CX e IA do Sicredi

Por Alceu Ruppenthal Meinen, Superintendente de CX e IA no Sicredi

Durante os dias 30 de setembro a 04 de outubro, tive a oportunidade de participar de uma missão no Vale do Silício, liderada pelo Instituto Caldeira, com foco em Inteligência Artificial (IA). Nesses dias, pude adquirir conhecimento sobre o tema e aprender sobre as boas práticas de utilização adotadas pelo mercado e pela academia, além de me atualizar sobre pesquisas e tendências futuras. Também tive a chance de fazer networking com profissionais da área de inovação e investidores. Durante a visita a diversas empresas, como C3.AI, Google, Salesforce, Air-group.ai, Oracle, Scale AI, Nvidia, Universidade de Stanford, Sede do Silicon Valley e hubs de startups, pude absorver aprendizados valiosos.

Uma das empresas que mais me chamou atenção foi a C3.AI, fundada por Thomas Siebel, um dos profissionais mais influentes da IA moderna e criador do CRM que conhecemos. A C3.AI possui uma plataforma completa de IA, capaz de se conectar a qualquer grande modelo de linguagem (LLM, da sigla em inglês) e serviço de computação em nuvem. Ter um sistema multimodal é bastante relevante atualmente, uma vez que existem várias LLMs disponíveis, cada uma com benefícios distintos que podem ser explorados graças a essa característica essencial.

Outra visita técnica foi ao Google, onde vários profissionais compartilharam informações sobre IA. O Google tem a visão de que, embora os dados sejam a solução, também podem ser um problema, pois a quantidade de dados pode ser avassaladora e nem sempre sabemos o que fazer com eles. Além disso, eles destacaram a redução do tempo de desenvolvimento com o uso da IA, onde o Time-to-Market passou de meses para semanas. De acordo com a equipe do Google, os desenvolvedores no Vale do Silício que têm adotado copilotos de IA estão alcançando um ganho de produtividade de 20%.

Durante uma conversa com Avansh Sahai, ele trouxe a ideia de que a grande mudança atual é a quantidade de dados disponíveis, o que está impulsionando evoluções principalmente no BackOffice, atendimento e software, e que isso continuará avançando, especialmente na personalização. No entanto, ele ressaltou a importância de ter uma arquitetura de dados que acompanhe essa evolução, utilizando tanto dados internos quanto dados públicos. Sahai demonstrou uma preocupação legítima com o avanço da IA e sua automação, pois um estudo do Goldman Sachs prevê que 25% das tarefas cotidianas de todos os tipos de indústrias serão automatizadas por IA até 2035. Essa evolução pode trazer grandes desafios sociais para o mundo.

Outra empresa que visitei foi a Air-group.ai, liderada por Alexis Rockenback. O que mais me chamou atenção foi o foco do grupo em utilizar IA na indústria de software. A empresa tem uma das principais linhas de receitas voltada para alocação de profissionais, e a indústria de software será a primeira a ser completamente impactada. As empresas que hoje estão focadas em vender horas de trabalho precisarão mudar seu modelo de negócio para venda de plataformas. Rockenback ressaltou a importância dos engenheiros de software utilizarem IA para aumentar a produtividade, caso contrário, não terão espaço nas empresas focadas em IA. É motivo de orgulho ver Rockenback no Vale do Silício, pois a origem de tudo foi em Passo Fundo, com o nome Compasso, e hoje se transformou em um grupo mundial com várias empresas, pensando no futuro onde praticamente todas as indústrias terão modificações utilizando IA.

Também visitei a Oracle, Salesforce e NVIDIA, três empresas que possuem uma grande fatia do mercado mundial. Tanto a Oracle quanto a Salesforce estão focadas em como incluir IA em seus processos nativos, possibilitando que as empresas tenham tudo em uma única plataforma para atender seus clientes. Vejo que a cada ciclo há evoluções nos produtos oferecidos, mas muitas vezes estão disponíveis apenas em inglês, o que dificulta o uso no Brasil. Já na NVIDIA, pude ver como uma empresa consegue manter seu Market Share no mundo. Seus produtos têm contribuído ativamente na evolução e expansão da inteligência artificial, tendo papel fundamental nos processos de treinamento e processamento de alguns dos maiores modelos da atualidade, já que seus processadores gráficos (GPUs, da sigla em inglês) são capazes de realizar cálculos e rodar modelos de IA em alta velocidade. Poucas empresas possuem GPUs próprias, a maioria utiliza modelos através de outras empresas, como a nuvem da AWS (Amazon), Google Cloud, entre outras, que certamente utilizam as GPUs da NVIDIA para rodar seus modelos.

Além disso, destaco a empresa Azion, que foi criada em Porto Alegre e está presente no Vale do Silício. Eles oferecem soluções de infraestrutura e segurança que podem ser muito úteis para empresas que estão utilizando IA. Tanto a Air-group.ai quanto todas as empresas que visitamos investem em Agentes de IA, que são sistemas que usam IA para executar tarefas, tomar decisões e interagir com o ambiente. Os agentes podem perceber informações do ambiente, analisar dados, tomar decisões baseadas em dados, realizar ações para modificar o ambiente, automatizar processos e responder perguntas. Esses agentes podem ser personalizados e adaptados a necessidades específicas.

Aliado aos agentes de IA, outro ponto que pude perceber um aumento nos modelos de inferência, mas afinal, o que é inferência? No campo de IA, é um processo em que um modelo de aprendizado de máquina treinado usa para tirar conclusões a partir de dados totalmente novos. Um exemplo de inferência seria um carro autônomo capaz de reconhecer um sinal de parada, mesmo em uma estrada em que ele nunca tenha passado. O processo de identificação desse sinal de parada em um novo contexto é a inferência.

Um ponto importante foi conhecer o Silicon Valley Bank e ver como é realizado o investimento em startups no Vale. Durante esse dia, tivemos várias rodadas de empreendedores, todos eles utilizando IA em seus processos. Também foi possível constatar que o investimento em IA está se expandindo para todas as indústrias, desde alimentação, com a extração de moléculas de sabor, até saúde, com a detecção de possíveis doenças futuras, segurança em bancos e análise preditiva para identificar potenciais investidores futuros. Uma lição que aprendi nesse dia foi que, se tiver uma boa ideia com potencial de escala, você encontrará um possível investidor para apoiar na construção e expansão do negócio. Ǫuanto maior for a maturidade do negócio, maior será o investimento encontrado.

Falando em empreendedorismo, um caso me chamou muita atenção: em 2018, o Dr. William Stanford começou a oferecer consultoria em medicina genômica e de precisão. Ele queria expandir esse atendimento para mais pessoas. Ao mesmo tempo, Bill Turpin, veterano da tecnologia, estava desenvolvendo uma plataforma de saúde que centralizaria e padronizaria as informações de pacientes para melhorar a coordenação do cuidado. Após se encontrarem, combinaram suas ideias para avançar a medicina de precisão. Dessa união surgiu a Biography Health, que ajuda os clientes a prevenir doenças e melhorar sua saúde e longevidade, utilizando ciência e tecnologia modernas com suporte personalizado. Isso gera uma reflexão de que não há idade para empreender. Vontade, conhecimento e o parceiro certo levam ao sucesso em qualquer fase da vida.

Por fim, destaco uma aula incrível na Universidade de Stanford com o professor Ilxa Strebulaev. Ele mencionou algumas falas que marcaram: a maioria das startups morre após conseguir escalar, pois, em um estudo, foi observado que, normalmente, quando uma startup atinge um número de 150 pessoas, começam os problemas. Até esse número, o fundador conhece todos e isso gera uma cultura de proximidade. Após isso, caso a empresa não repense seus processos, tende a não suportar e fechar. Ilxa ressaltou que um dos pontos mais importantes das empresas é cuidar da cultura desde o primeiro dia, pois a cultura pode destruir qualquer estratégia, por mais bem feita que seja. Portanto, é muito importante que, após atingir um certo tamanho, sejam feitas adaptações na cultura. O Google e a Nvidia foram citados como exemplos de empresas que mantêm a cultura de inovação através do intraempreendedorismo, para que não deixem de inovar. Outro ponto importante é que muitas empresas também têm fechado porque não conseguem ter clareza de que chegaram a um platô. Sem essa clareza, as empresas param de inovar, o que pode ser fatal. Por isso, é importante sempre buscar o próximo estágio de inovação. Essas reflexões me fizeram pensar que as empresas precisam definir suas culturas e seus processos, caso contrário, vão morrendo aos poucos.

Fazendo uma comparação com o que vi e presenciei, faço uma analogia com o que estamos fazendo aqui no Sicredi. Já utilizamos IA desde 2018 e posso afirmar que, no atendimento, temos maturidade, pois os números de retenção são bons. Hoje, 79% de tudo que passa pela IA é resolvido. Isso já trouxe uma produtividade de mais de 1.200 pessoas no atendimento, o que suportou o crescimento do Sicredi, saindo de mais de 4 milhões de pessoas para mais de 8 milhões, sem a necessidade de aumentar o número de pessoas no call center. Atualmente, estamos em uma fase mais inicial em uso de IA na engenharia de Software, onde temos mais de 120 desenvolvedores utilizando IA em seu dia a dia, buscando ainda mais valor gerado. Vale lembrar que as empresas do Vale trouxeram que já têm um aumento de produtividade de 20%.

Recentemente, implementamos um sistema baseado em IA para buscar em nossa base de conhecimento centralizada, resumir e responder em linguagem natural as perguntas dos nossos colaboradores. Também adicionamos um modelo LLM com agentes especialistas ao projeto de experiência do associado, onde cada um é responsável por categorizar dentro das respectivas árvores e identificar o sentimento do associado que comenta cada uma das nossas pesquisas de NPS. Considerando que os comentários eram anteriormente revisados por um agente humano, o custo de processarmos utilizando IA é cerca de 30 vezes menor na escala atual. Outro projeto que se encontra em experimentação é a utilização de agentes LLM para potencializar a compreensão do Theo, buscando torná-lo capaz de compreender e identificar os assuntos em expressões regionais, sentenças mais longas ou mesmo as menos detalhadas ou com equívocos de digitação. Isso deve tornar a experiência do colaborador e associado mais fluida e direta, e aumentar a confiabilidade, escalabilidade e diminuir o tempo de identificação e desenvolvimento de resposta a assuntos mais acionados.

A infraestrutura do Sicredi já está pronta para suportar o crescimento do uso de IA. Assim como a arquitetura está avançando, a arquitetura de dados tem avançado muito após a implementação da plataforma de dados, suportando o avanço de modelos cada vez mais pesados. À medida que os modelos forem maiores, utilizaremos ainda mais a capacidade de processamento da Nvidia através de nossos parceiros de nuvem.

Assim como todas as empresas do mundo, estamos avançando na utilização de modelos de machine learning e deep learning para aprimorar a personalização das ofertas aos associados, analisar riscos relacionados à concessão de crédito, revisar e aumentar os limites de crédito. Isso deve evoluir muito durante o ano de 2025. Já na automação de serviços, começamos pelas tarefas dos serviços jurídicos, bem como pelos autosserviços, onde já temos mais de 200 possibilidades em todos os produtos financeiros. Isso vai acelerar com uma estratégia de venda aliada à personalização das ofertas.

Ǫuanto à cultura, vejo o Sicredi no caminho certo, pois sempre está olhando e adaptando a cultura para que a empresa continue tendo o sucesso de mais de 120 anos, com pessoas felizes e entregando valor para nossos associados.

Em resumo, alguns aprendizados que tive foram que o modelo de IA será tão bom quanto os dados utilizados, e que os dados são o conhecimento dos negócios. Não basta ter os dados, é necessário saber o que fazer com eles. Além disso, o desafio para os profissionais de IA será manter-se atualizado, pois as mudanças são diárias. A exaustão das pessoas é uma preocupação, já que as mudanças que antes eram mais lentas agora ocorrem diariamente.

A IA vai oferecer, em breve, uma série de benefícios em termos de escalabilidade, velocidade e consistência. Isto ficou ainda mais evidente após o Prêmio Nobel de Física de 2024, que foi concedido aos cientistas Geoffrey Hinton e John Hopfield, por seu trabalho em machine learning, um campo da ciência da computação voltado para o aprimoramento de Inteligência Artificial.

A pesquisa pioneira de Hinton sobre redes neurais abriu caminho para os atuais sistemas de IA, como o ChatGPT. Na inteligência artificial, as redes neurais são sistemas semelhantes ao cérebro humano na forma como aprendem e processam informações. Elas permitem que as IAs aprendam com a experiência, como uma pessoa faria. Isso é chamado de aprendizado profundo. A abordagem das empresas permitirá que as organizações aproveitem ao máximo esses benefícios, impulsionando a eficiência, a economia de custos e o aumento da disponibilidade de ativos.

Além disso, destaco a importância de investimentos e energia para suportar todo o potencial que está por vir. Atualmente, o mundo não possui energia suficiente para atender a essa demanda, por isso países como o Canadá têm investido muito em sua matriz energética, tornando-se um dos maiores produtores de energia do mundo. Isso faz com que as empresas migrem seus data centers para lá ou forneçam energia para muitos países. Portanto, o investimento em estudos, pessoas e tecnologia para aproveitar todo o potencial da IA será primordial para as empresas evoluírem neste mundo de IA.