Cultura maker: a importância do conceito “mão na massa” na era pós-digital

Cultura maker: a importância do conceito “mão na massa” na era pós-digital

O conceito de cultura maker está baseado na ideia de que as pessoas devem ser capazes de fabricar, construir, reparar e alterar objetos dos mais variados tipos e funções com as próprias mãos.

Embora a ideia tenha nascido do movimento “Do It Yourself” (Faça Você Mesmo), originado nos Estados Unidos no pós guerra dos anos 1950, ela foi se renovando com o passar do tempo e pode ter um papel fundamental na chamada era pós-digital.

Essa visão foi compartilhada  pelo fundador da WTF! School, engenheiro de produção e professor universitário, Felipe Menezes, durante  masterclass realizada no Instituto Caldeira.

Eu poderia focar nas imagens clichês, falando que essa pode ser a próxima revolução industrial. Mas o que eu quero propor é uma discussão um pouco mais autêntica e profunda, porque, na minha opinião, cultura maker é muito mais do que isso que encontramos facilmente”, provocou.

Foi só na década de 1970, comentou ele, que o movimento da Cultura Maker se potencializou, com a criação das impressoras 3D e outras máquinas para prototipação. Outro marco na história dessa corrente, segundo ele, foi a criação da revista norte-americana Make, no ano de 2005.

A publicação, com tiragem mensal de 100 mil exemplares, atraiu amantes de tecnologia, educadores e cientistas, o que contribuiu para a popularização das ideias. Junto da revista, houve o surgimento, em 2006, da Maker Faire, feira que fortaleceu ainda mais o pensamento Do It Yourself em diferentes cantos do mundo.

Hoje, podemos dizer que são 5 os pilares deste movimento: criatividade, sustentabilidade, colaboração, democratização e empoderamento. E o locais onde mais vemos a cultura maker em ação são, claro, os chamados Fab Labs ou laboratórios de fabricação digital, onde é possível encontrar equipamentos como impressoras 3D, cortadoras a laser, fresadoras digitais, entre outros.

Bulbasauro em 3D

Para aprofundar o assunto, o professor trouxe algumas de suas experiências com o movimento. Uma das primeiras ocorreu em 2017, durante o Fórum Internacional de Software Livre, quando estava acompanhado de Pedro, o seu filho mais velho.

Ao ver que estavam sendo criados alguns tipos de bonecos a partir da tecnologia, Pedro perguntou se era possível fazer uma impressão 3D do bulbasauro, personagem conhecido da série de jogos Pokémon.

Sem experiência com a tecnologia na época, Menezes conta que, a partir de plataformas como Thingiverse, na qual os usuários compartilham modelos prontos para a impressão 3D e a 3D Hubs, cuja missão é conectar pessoas que têm uma impressora 3D com outras que não possuem, mas desejam imprimir algo, conseguiu atender o pedido do seu filho.

Também relata o episódio em que, com a ajuda de um aluno, construiu uma impressora 3D na sala de sua casa. Com a ferramenta, já produziu óculos e até um par de tênis para uso próprio. “Conto essas histórias para legitimar que eu posso falar um pouco sobre cultura maker, porque isso faz parte da minha vida há bastante tempo”, declarou.

Era das relações

Mudanças importantes foram acontecendo ao longo das diferentes eras no processo de fabricação e os seus impactos na economia. Enquanto na paleolítica e neolítica a preocupação do homem se resumia a sua subsistência, na agrícola o valor para ele passou a ser a terra. Na industrial, por sua vez, o capital ganhou protagonismo até que, na era digital, a informação e os dados se transformaram no “novo petróleo”.

Agora, na era pós-digital, segundo Menezes, o que deve ser cada vez mais valorizado são as relações.

Relações entre pessoas, de pessoas com as empresas – com o atendimento humanizado e o foco no usuário – e na relação das pessoas com seus próprios objetos”, explica.

Para o engenheiro, essa ‘nova era’ é potencializada com o surgimento de movimentos, como as organizações Teal, companhias caracterizadas por ter um nível de consciência elevado; o capitalismo consciente; o sistema B, que é uma certificação alternativa que busca equilibrar propósito e lucro; o modelo econômico da economista Kate Raworth chamado Dunnets, que propõe um sistema no qual as necessidades sociais podem ser satisfeitas sem esgotar os recursos do planeta, entre outros.

“As ideias que envolvem a cultura maker voltam a ganhar força, e possuem um papel muito importante nisso, pois podem criar um caminho de co-autoria em massa, evitando o desenvolvimento dos produtos, dos serviços e dos sistemas na mão de poucas pessoas e contribuindo para a redução da produção e do consumo, que tem feito muito mal para o nosso planeta”, defende Menezes.

E finaliza: “Se não construirmos o mundo que a gente quer, alguém vai construir pra gente”.